Não é só Ronaldinho: como são os rolês aleatórios que pagam até R$ 800 mil a ex-craques da Seleção - BS NOTÍCIAS

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terça-feira, 29 de abril de 2025

Não é só Ronaldinho: como são os rolês aleatórios que pagam até R$ 800 mil a ex-craques da Seleção

 


Campeões das Copas de 2002 e 1994, como Rivaldo, Edmilson e Lúcio, encaram viagens a locais pouco usuais para promover futebol brasileiro; dessa vez, com jantar de gala e inauguração.


Faltavam 30 minutos para servir o café da manhã quando Ronaldinho, sem dormir, chegou ao saguão do hotel em Chennai, no sul da Índia. Estava cansado da viagem, sentindo o fuso pós-Londres, mas acima de tudo faminto. Então quando as portas se abriram, às 6h30 da manhã, o campeão mundial, sem hesitação, mandou uma macarronada direto no prato.

– Todo mundo falou: "Já está aqui? Batendo almoço logo de manhã" – conta o organizador do evento, Ricardo Ximenes, aos risos.

Ali, o cardápio inusitado marcava apenas o início de uma viagem de cinco dias, que levou uma dezena de campeões mundiais, em voos classe executiva, com cachês pagos, para um evento de três atos na Índia: encontro com crianças, jantar beneficente e um jogo para 23 mil pessoas no Estádio Jawaharlal Nehru. O Brasil venceu por 2 a 1.


Cruzaram o oceano, assim como Ronaldinho, sete campeões da Copa de 2002 e quatro de 1994. Entre eles, Rivaldo, Lúcio, Edmilson, Gilberto, Júnior, Amaral, Viola, Paulo Sérgio e até Dunga, que fez o papel de técnico do time. Também estiveram atletas como Giovanni, de 1998, e Ricardo Oliveira, que perdeu a Copa de 2006 por uma ruptura de ligamento.

– Muitas vezes só vamos nos encontrar nesses momentos, então terminava o almoço e a gente ficava conversando, cada um contando sua história – diz Paulo Sérgio, tetracampeão em 1994.

Ronaldinho Gaúcho e Dunga nos vestiários do Brasil antes de jogo com All Stars da Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

Ronaldinho Gaúcho e Dunga nos vestiários do Brasil antes de jogo com All Stars da Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

O trabalho de convencimento? Funciona na base da confiança e credibilidade, diz Ximenes, uma vez que os atletas não querem, como dizem, "entrar em uma barca".

Mas o financeiro também ajuda, claro. São pagos cachês de cinco a 10 mil dólares em média para cada atleta, que por vezes levam familiares, acompanhantes, e têm logística de visto, hospedagem, alimentação e segurança mobilizados e custeados pela organização.

Só de passagem são 250 mil dólares. Classe executiva para todo mundo. A questão financeira acaba ajudando, mas acho que o que mais motiva é reviver tudo aquilo que viveu um dia sendo profissional.
— diz Ricardo Ximenes.
Kleberson, Ronaldinho e Gilberto Silva em Chennai, na Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

Kleberson, Ronaldinho e Gilberto Silva em Chennai, na Índia — Foto: Brazil Soccer Academy


O cachê mais caro já pago pela organização foi de 150 mil dólares. Não pelo cacife do atleta em questão, mas pelo que o evento exigia. Na negociação, chegou-se a este valor. O dinheiro, por sua vez, vem do contratante internacional interessado, enquanto os repasses são feitos pelo empresário.

– Pago os atletas antes da viagem. Até porque tem jogadores que já deixaram de receber de outras organizações, empresas que não pagaram – justifica ele, explicando o próprio método e sem revelar quem foi o jogador "mais caro".

É uma verdadeira indústria, especializada em eventos com selecionado brasileiro fora do país.

Veja momentos de Ronaldinho Gaúcho na Índia com campeões do mundo
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Veja momentos de Ronaldinho Gaúcho na Índia com campeões do mundo

Investimento é milionário. Quem paga a conta?

A Brazil Soccer Academy, empresa gerenciada por Ximenes, está há 20 anos no ramo, levando atletas ao Vietnã, Burundi, Uganda, Quênia e Madagascar, por exemplo, com duas frentes de trabalho: a "business" e a humanitária.

Na humanitária, atua em centros de refugiados e cidades em situação de calamidade. Foi ao Iraque e Turquia, por terremotos em 2023, à Síria em 2019 e Mianmar, em 2008, para reconstruir uma cidade destruída pelo ciclone Nargis, que deixou mais de 31 mil mortos no país.

– Fizemos amistosos nos países em volta do Sudeste Asiático, vendendo ingressos e levando recursos para reconstruir escolas, creches. Tento servir de alguma maneira através do futebol. Na Síria, em 2019, acabei adotando minha filha, uma menina que perdeu o pai e a mãe – conta Ximenes.

Clínica de futebol na Jordânia durante evento da Brazil Soccer Academy — Foto: Brazil Soccer Academy

Clínica de futebol na Jordânia durante evento da Brazil Soccer Academy — Foto: Brazil Soccer Academy

No business, a história é diferente. A empresa é procurada pelas instituições interessadas e faz uma seleção, com visitação ao local, para decidir que eventos realizar. No avião voltando da Índia, por exemplo, Ximenes diz que conversava simultaneamente com outros cinco interessados no projeto.

A meta é trabalhar com dois jogos por ano, três no máximo. Isso porque cada evento precisa de três a quatro meses de organização, por uma questão de logística, valores altos e a agenda dos jogadores. O investimento? Cerca de um milhão de dólares para tirar do papel.

Os contratantes entram com todo o dinheiro. A empresa brasileira, por sua vez, cobra um valor fixo para organizar o time e acaba prestando consultoria sobre captação de recursos através de patrocínio, televisão e jantares.

As viagens incluem ex-jogadores profissionais brasileiros, mas principalmente nomes com passagem pela seleção brasileira. Nunca antes, contudo, houve tantos campeões reunidos em um mesmo evento como na Índia.

Ronaldinho Gaúcho em campo durante jogo festivo com All Stars da Índia, em Chennai — Foto: Brazil Soccer Academy

Ronaldinho Gaúcho em campo durante jogo festivo com All Stars da Índia, em Chennai — Foto: Brazil Soccer Academy


Os bastidores na Índia

A viagem começou com a inauguração de uma escolinha de futebol em Chennai, chamada Football Pro Soccer Academy, em que Rivaldo e Ronaldinho cortaram as faixas amarelas de abertura, rodeados de 100 crianças e familiares, escolhidas para terem acesso a fotos e autógrafos.

Uma delas, conta Ximenes, vestia uma camisa customizada com o nome "Dinho" nas costas, reproduzida pela criança dias após o lançamento da Nike em homenagem ao uniforme do primeiro time em que Ronaldinho jogou quando era mais novo.

Rivaldo cortando faixa de inauguração de centro de excelência na Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

Rivaldo cortando faixa de inauguração de centro de excelência na Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

Depois da escolinha, um jantar de gala, com a participação dos atletas - Ronaldinho desfrutando de alta culinária, dessa vez -, recebeu 150 participantes e cobrou ingressos a preço de R$ 2 mil. A meta era levantar fundos para uma organização indiana que trabalha com crianças em situação de vulnerabilidade.

Ronaldinho Gaúcho em jantar de gala durante viagem de campeões mundiais na Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

Ronaldinho Gaúcho em jantar de gala durante viagem de campeões mundiais na Índia — Foto: Brazil Soccer Academy

Até que chegou o dia do jogo. Era o encontro de "Lendas do Brasil" contra o All Stars da Índia, na esperança de invocar nostalgia e reacender o interesse pelo futebol na cidade, marcada pelo consumo do cricket. Tanto que o estádio recebe até 80 mil pessoas em jogos do esporte mais famoso no país, mas é raro encher com futebol.

É a primeira vez que enche, por conta do Ronaldinho.
— diz Ximenes.
Fãs de Ronaldinho esperando para pedir autógrafos ao brasileiro — Foto: Brazil Soccer Academy

Fãs de Ronaldinho esperando para pedir autógrafos ao brasileiro — Foto: Brazil Soccer Academy

Ronaldinho chegou ao estádio em uma luxuosa BMW, sequestrou as atenções para si, e Ximenes conta que até o exército precisaram mobilizar para fazer a segurança dos atletas até o estádio.

Porque tem o dobro, o triplo, de pessoas do lado de fora, só para ver os jogadores. Muita gente querendo tocar.
— explica o organizador.

É justificável pelo valor dos ingressos, que custavam 100 dólares no setor mais barato, podendo chegar a 200 dólares no mais caro. É o equivalente a um salário mínimo na Índia. Diante dos 23 mil que puderam pagar, portanto, o Brasil disputou dois tempos de 35 minutos, com aplausos sempre que Ronaldinho tocava na bola.

– Lógico que todo mundo está lá para se divertir, ninguém tem mais a mesma força, mas a pressão é pra ganhar – conta Paulo Sérgio.

E assim foi. Viola, campeão em 1994, abriu o placar, Bibiano Fernandes empatou pela Índia, e Oliveira garantiu a vitória do Brasil por 2 a 1. Encerrando, com bolas lançadas às arquibancadas, a visita inusitada em mais um projeto da indústria de campeões.



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