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Bahia

Coluna do Ricardo Viveiros

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COMO FICA O CONSUMIDOR?

Muito já se fez, se faz e, infelizmente, ainda se fará de maneira no mínimo descuidada em nome da democracia, do livre mercado e dos direitos sociais que, supostamente, protegem o cidadão, o consumidor e o contribuinte.

Criado nos Estados Unidos, no final da década de 2000, o serviço eletrônico na área de transportes privados urbanos (e-hailing) permite, com um aplicativo instalado em aparelho telefônico celular, operação semelhante à de usar o tradicional táxi.

Uma “carona remunerada”, porque os motoristas são proprietários de seus veículos, não são profissionais, assumem os gastos (impostos, combustível, conservação, seguros e reparos) e fazem o horário que lhes interessa.

Ou seja, com baixos custos para o informal “empregador”.

Cinco anos depois da novidade, apenas uma empresa do segmento, a Uber Technologies Inc., era avaliada em mais de 18 bilhões de dólares, tendo investidores do peso da Goldman Sachs, Google e Microsoft.

A Uber tornou-se multinacional e estendeu sua ação a diversos países.   

O serviço foi criado para oferecer “luxo”, limusines e helicópteros para personalidades que buscam algo especial.

Em pouco tempo, passou a concorrer com os táxis convencionais.

Em países como França, Alemanha, Espanha, Coreia do Sul, Japão, China, Índia e México não foi nada fácil a chegada dos aplicativos de transportes.

Na Bélgica, Grécia, Holanda e Suíça, há restrições.

Além de muitos protestos, os governos fizeram exigências, cobram impostos e fiscalizam o cumprimento do prometido.

Em Nova York (EUA), seu berço, a Uber foi autuada em 8 milhões de dólares.

Também recebeu punições em Los Angeles e San Francisco.

Na Colômbia, houve multas de até 450 milhões de pesos.

Aqui no Brasil, os aplicativos de transportes privados chegaram em 2014, no Rio de Janeiro (RJ).

Pouco tempo depois, estavam em todo o País.

Com protestos dos taxistas, alguma solidariedade de seus passageiros e a concordância dos municípios, mas sempre em nome do livre mercado e interesse da sociedade.

Porque os carros eram melhores, novos, limpos e confortáveis, os motoristas bem vestidos, simpáticos e que ofereciam água fresca, balas, jornais/revistas e, acima de tudo, em razão de os preços praticados serem mais baratos, com rapidez e facilidade de pagamento, os prefeitos e as câmaras de vereadores encontraram os argumentos necessários para – “respeitando o interesse público” – quebrar o monopólio dos táxis oficiais, sob regulamentação, tributação e fiscalização das municipalidades, e autorizar a entrada no mercado da modernidade.

A chegada dos aplicativos de transportes privados urbanos mudou muita coisa em relação aos táxis tradicionais: dissipou o alto preço no mercado ilegal de compra e venda das licenças, introduziu carros novos, limpos, que aceitavam cartões de débito/crédito, ofereciam facilidades e eram mais rápidos no atendimento às chamadas.

No entanto, o que prevalecia em favor dos aplicativos era o preço baixo, incluindo, muitas vezes, atrativas ofertas-relâmpago. 

O tempo passa, tudo se acomoda e o que se verifica na prática? 

Surgiram e morreram outros aplicativos: Cabify, Easy Táxi, Vá de Táxi, Me Leva e BlaBlaCar.

Surgiram e ficaram serviços de entregas de mercadorias, concorrendo com os Correios e as empresas transportadoras tradicionais.

Sem a necessária fiscalização dos órgãos públicos, tudo mudou nos carros de palicativo.

E para pior.

Não há mais facilidades (água, balas, jornais/revistas etc.); o tempo de espera aumentou; motoristas que aceitaram uma chamada, ao terem outra opção mais lucrativa, desistem, não avisam e, ainda, cobram taxa do usuário que ficou esperando sem atendimento e pediu outro carro; acabaram as promoções.

Por fim, há uma controversa avaliação do passageiro: reclame de alguma coisa, mesmo com razão, e não mais será atendido por nenhum motorista, porque sua “pontuação” cairá.

Uma inversão de valores entre fornecedor e consumidor. 

Entretanto, o grave mesmo fica por conta do principal argumento usado pelas municipalidades, prefeitos e vereadores, para autorizar/regulamentar esses aplicativos: o preço.

Às vésperas do Natal, Ano Novo e outras datas comerciais, bem como em horários nobres, os valores das corridas subiram de tal forma que superaram, em muito, os dos táxis tradicionais. 

É hora de alguém colocar ordem no assunto: prefeitos; vereadores; Ministério Público. Enfim, não podemos voltar ao passado.

Avanços – e esse serviço, de fato, constitui-se em um – são para dar certo, no mundo e também aqui neste “país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza”. 

Ricardo Viveiros, jornalista, professor e escritor, é doutor em Educação, Arte e História da Cultura (Universidade Presbiteriana Mackenzie); autor, dentre outros livros, de "A vila que descobriu o Brasil", "Justiça seja feita" e "Memórias de um tempo obscuro". Apresenta o programa “Brasil, mostra a tua cara!” às sexta-feiras, 23 horas, na TV Cultura.

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