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Envolta em molde contemporâneo, A Última Entrevista de Marília Gabriela é bom drama familiar

Espetáculo apresenta embate entre mãe e filho com diálogos que fazem bem ao enganar a plateia

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Theodoro Cochrane e Marília Gabriela

Inegavelmente há certo ar de modernidade em A Última Entrevista de Marília Gabriela , espetáculo que marca o retorno da jornalista e apresentadora Marília Gabriela aos palcos seis anos após sua última investida, Casa de Bonecas 2 , do nova iorquino Lucas Harndt acerca de uma possível continuação ao clássico homônimo de Henrik Ibsen (1828-1906).

Se buscava emular uma Nora libertária naquela obra, nesta montagem a jornalista se apresenta despida de qualquer personagem senão o de sua própria figura pública, que enfrenta a prova de fogo ao se ver desconstruída pelas impressões de seu filho, o ator, cenógrafo e figurinista Theodoro Cochrane. “É teatro contemporâneo”, repetem em diálogos lidos em cena sem qualquer inibição.

Todos os signos apresentados pela direção de Bruno Guida e pela dramaturgia de Michelle Ferreira levam a crer que, de fato, trata-se de uma experiência envolta na ideia de um teatro contemporâneo pronto a romper com os dogmas estruturais do chamado teatro convencional.

O cenário multimídia assinado por Guida, o desenho de luz estático de César Pivetti, o relacionamento (até) surpreendente com a plateia, e o texto que parece fugir à uma história  comum aprofundam a impressão.

Pistas falsas. À medida que A Última Entrevista de Marília Gabriela prossegue, o texto de Michelle Ferreira se comprova como mais um embate entre um filho e sua figura materna, clássico drama familiar. E, no caso, um ótimo drama familiar que leva em conta alguns dos principais temas do gênero como as lembranças da infância, a culpa, a suposta falta de remorso em verdades crueis que são ditas em momentos de extrema tensão e embate.

O texto, inclusive, se deixa levar pelas mesmas armadilhas de clássicos dramas familiares ao propor uma manutenção da relação entre as personagens que resvala no melodrama, mas é bem driblada pela direção segura e inventiva de Bruno Guida e pelo desempenho do elenco, que se mostra (presumivelmente) afinado em cena.

A Última Entrevista de Marília Gabriela talvez seja o melhor momento de Marília Gabriela em cena. Ainda que tenha tido bons desempenhos em espetáculos como  o supracitado Casa de Bonecas 2 , Constelações ou mesmo no longínquo Senhora MacBeth , sempre pairou na figura da apresentadora certo desconforto com o palco – talvez reflexo  das direções sempre cambaleantes das últimas montagens que protagonizou. Não é o que acontece aqui.

A montagem não só dá a apresentadora a segurança de se sentir à vontade, como também resolve de forma muito mais efetiva a ideia de trabalhar em cena sua figura pública enquanto uma espécie de objeto de estudo midiático quase 25 anos antes em Esperando Beckett , obra concebida e dirigida por Gerald Thomas para a jornalista. A direção de Guida leva a artista a expor com fluidez suas fragilidades frente à imagem quase mítica que o público se acostumou a relacionar a ela.

E são essas fragilidades que fazem com que a montagem cresça, principalmente quando se dá o ápice do conflito entre mãe e filho, que fica cada vez mais fluente – mérito do ótimo desempenho de Cochrane – quando atinge temas como a frustração, a mágoa suprimida por décadas e o sentimento de fracasso parental, tudo apimentado com toques pseudo biográficos do relacionamento entre a apresentadora e seu filho.

Dupla pop do teatro contemporâneo, Bruno Guida e Michelle Ferreira dão passo adiante no ponto de maturação que sua parceria atingiu em 2021, com a montagem de Bárbara , monólogo estrelado por Marisa Orth com base em A Saideira , livro autobiográfico da jornalista Bárbara Gancia no qual narrou sua luta contra o alcoolismo.

A produção foi sucesso de público e de crítica colocando a dupla em alto patamar que recebe manutenção fluente de A Última Entrevista de Marília Gabriela em cartaz no palco do Teatro Unimed, em São Paulo até 28 de jullho e que comprova que para fazer com que o teatro contemporâneo ocorra, não é preciso extinguir antigos dogmas, apenas saber como moldá-los.

COTAÇÃO: * * * * (Ótimo)

SERVIÇO

A Última Entrevista de Marília Gabriela

Data: 03 de maio a 28 de julho (sexta a domingo)

Horário: 20h (sextas e sábados); 18h (domingos); 17h (sábados – sessões extras)

Local: Teatro Unimed, São Paulo – SP

Endereço: Ed. Santos Augusta, Al. Santos, 2159 – Jardins, região centrosul

Preço do ingresso: R$ 60 (meia) a R$ 180 (inteira)

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